Sonora Festival https://sonorafestival.com Sonora Festival Tue, 26 Nov 2024 18:12:47 +0000 pt-BR hourly 1 https://sonorafestival.com/wp-content/uploads/2024/11/cropped-cobra-pev-32x32.png Sonora Festival https://sonorafestival.com 32 32 Sonora lança plataforma para mapear iniciativas de igualdade de gênero na música em todo o mundo https://sonorafestival.com/sonora-lanca-plataforma-para-mapear-iniciativas-de-igualdade-de-genero-na-musica-em-todo-o-mundo/ https://sonorafestival.com/sonora-lanca-plataforma-para-mapear-iniciativas-de-igualdade-de-genero-na-musica-em-todo-o-mundo/#respond Tue, 26 Nov 2024 17:56:04 +0000 https://sonorafestival.com/?p=873 Já são 8 anos desde que o Sonora – Festival Internacional de Compositoras explodiu no Brasil e alcançou ainda outros países, como Argentina, Espanha e Uruguai. Além de promover eventos que celebram a mulher compositora, o Sonora sempre teve como intuito pesquisar o espaço da mulher na música nacional e promover ações para enfrentar as barreiras de gênero, que trazem desafios significativos para a visibilidade, oportunidades de trabalho, geração de renda, reconhecimento e segurança das mulheres. Agora, em parceria com o Ibermúsicas, lançam o novo projeto Sonora Conecta.

A plataforma é dedicada a mapear e conectar iniciativas de empoderamento feminino na música no mundo todo e será lançada junto à pesquisa “Iniciativas de empoderamento feminino na música no mundo”, no dia 27 de novembro, às 19h30, no Mezanino do SESC Palladium (Rua Rio de Janeiro, 1046. Av. Augusto de Lima, 420). A programação contará com a apresentação da plataforma e dos primeiros resultados da pesquisa, assim como a presença e troca de experiências entre as responsáveis de quatro das iniciativas mapeadas em Belo Horizonte: Sofia Cupertino (Residência Venusiana), Manu Ranilla (Pandeiristas e Negras Autoras), Débora Ventura (Truck do Desejo) e Ana Linares (Festival ELAS).

Idealizada e coordenada por Isabella Bretz e realizada em parceria com Deh Muss (criadora do Festival Sonora), a pesquisa começou a ser desenvolvida em 2023 com o apoio do programa Ibermúsicas e com foco na Ibero-América. Foram levantadas ações diversas nos 22 países que fazem parte do bloco. A Ibero-América é uma região do continente americano que compreende os países ou territórios onde o português ou espanhol são as línguas predominantes, incluindo também Portugal e Espanha, que estão no continente europeu.

Entre as descobertas, a pesquisa mostrou que há uma grande variedade de iniciativas pelo Brasil que visam e buscam o empoderamento feminino. Essa diversidade pode contribuir para mudanças mais robustas na visibilidade e nas oportunidades das mulheres na música. Das 71 iniciativas mapeadas no Brasil, 49 estão na região Sudeste. Essa concentração de iniciativas na região sugere que, embora haja iniciativas significativas em vários lugares, há uma grande necessidade de expansão e apoio em outras regiões do país para aumentar a equidade de acesso, representação e visibilidade.

As iniciativas mapeadas na plataforma Sonora Conecta abrangem diversas abordagens, como: Formação, Festival/Mostra, Pesquisa, Selo/Gravadora, Performance, Empresa, Coletivo, Fundo/Bolsa, Criação Artística, Conferência/Simpósio, Espaço Criativo, Podcast, Livro, Filme/Documentário, Premiação e Outros. Essas categorias refletem a variedade de enfoques das iniciativas no âmbito da música, promovendo uma rede diversa e colaborativa no empoderamento feminino no setor.

Com o apoio do Fundo Municipal de Cultura de Belo Horizonte, a investigação está sendo aprofundada em Belo Horizonte, cidade natal do Sonora. Em 2024, com o apoio da União Brasileira de Compositores – UBC, o mapeamento em Minas Gerais está sendo trabalhado e foi possibilitada a participação de outra pesquisadora, a artista e produtora mineira Elisa de Sena.

“Não somos as primeiras e nem seremos as últimas. São muitas iniciativas buscando esse mesmo objetivo, que é a igualdade de gênero na música. Só que ainda há pouca conexão entre as ações. Estamos preparando uma plataforma online chamada Sonora Conecta, com um mapa interativo através do qual as pessoas poderão descobrir e registrar festivais, selos, formações e variados projetos que buscam o empoderamento da mulher na carreira musical. Esses dados poderão ser usados para criar parcerias, cooperações e até mesmo circulação de shows e formação das próprias artistas. Pouco a pouco, queremos colocar informações de todos os continentes. Há resultados na nossa sociedade que só são possíveis em rede”, comenta Isabella Bretz sobre o impacto da pesquisa.

Já em seu primeiro ano, o Sonora – Festival Internacional de Compositoras, por iniciativa de Isabella Bretz foi internacionalizado, chegando a Portugal, Irlanda (países nos quais realizou), posteriormente marcando presença também na Argentina, Espanha e Uruguai. Nos anos seguintes, o Sonora alcançou 74 cidades em 16 países. Deste então, mais de 1000 compositoras se apresentaram nos seus palcos, por meio do trabalho cuidadoso das produtoras. Além disso, novos festivais, coletivos, selos e outras iniciativas surgiram a partir de mulheres que passaram pela rede.

“Eu vinha trabalhando com projetos feministas na música já há muitos anos. Mas é impressionante como a proposta do Sonora foi imediatamente difundida entre produtoras e artistas. Parece que havia uma grande sede por isso, um vazio a ser preenchido. Essa radiação criou uma rede colaborativa que levou o Sonora a vários estados do Brasil de forma imediata”, declara Deh Muss.

Em 2016, a artista mineira Deh Muss, em resposta a uma fala de que havia poucas mulheres compositoras, convocou mulheres a publicarem vídeos nas redes sociais cantando suas próprias músicas, acompanhados da hashtag #mulherescriando. No dia marcado, de forma inesperada e arrebatadora, a ação tomou conta das redes sociais. De norte a sul do Brasil, mulheres de todas as regiões começaram a compartilhar suas vozes, suas histórias e suas composições. Era como se uma chama tivesse sido acesa. Ela se espalhou rapidamente, despertando uma energia de transformação. Com o calor desse movimento, Deh Muss, Flávia Ellen, Amorina e Bia Nogueira (Belo Horizonte), Ana Luisa Barral (Salvador), LaBaq (São Paulo), Ilessi (Rio de Janeiro) e Isabella Bretz (BH, Lisboa e Dublin) se uniram para elaborar um festival no qual tantas mulheres pudessem ter um espaço profissional para alcançar o público, sem serem barradas por visões limitadas de programadores que excluíam deliberadamente mulheres de seus line-ups. Atualmente, o Sonora prossegue com esse objetivo, aprofundando suas ações nos braços de show, formação e pesquisa.

SERVIÇO

Lançamento da plataforma Sonora Conecta

Com mesa debate formada por Sofia Cupertino (Residência Venusiana), Manu Ranilla (Pandeiristas e Negras Autoras), Débora Ventura (Truck do Desejo) e Ana Linares (Festival ELAS) e lançamento da pesquisa “Iniciativas de empoderamento feminino na música no mundo”

Data: 27 de novembro, quarta-feira

Horário: às 19h30

Local: Sesc Palladium (R. Rio de Janeiro, 1046 – Centro, Belo Horizonte – MG, 30160-041)

Entrada gratuita

 

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RIOT GRRRL’S NOT DEAD – Uma investigação acerca da diferença de gênero na cena rock de Belo Horizonte https://sonorafestival.com/riot-grrrls-not-dead-uma-investigacao-acerca-da-diferenca-de-genero-na-cena-rock-de-belo-horizonte/ https://sonorafestival.com/riot-grrrls-not-dead-uma-investigacao-acerca-da-diferenca-de-genero-na-cena-rock-de-belo-horizonte/#respond Tue, 26 Nov 2024 17:29:18 +0000 https://sonorafestival.com/?p=888 Este artigo apresenta memórias e registros extraídos de minha monografia para a obtenção do diploma no curso de Licenciatura em Música pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), concluída em 2011. Nele, analiso um aspecto do feminismo na música que, à época, manifestava-se predominantemente na cena underground de Belo Horizonte. Este recorte histórico oferece uma base para refletirmos sobre os caminhos percorridos pelo feminismo na música, especialmente até o período pós-2015, quando o movimento ganha força e começa a ocupar também o mainstream musical.

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Este trabalho possui como principal objetivo uma investigação, de um evento musical de cunho feminista, com bandas de rock – RIOT GRRRL’S NOT DEAD – considerando o evento como um todo, tendo um foco mais específico: a relação entre as bandas e a diferença de gênero nesta estética musical. Para que fosse alcançado tal objetivo, a metodologia constou de depoimentos das produtoras do evento e um documentário sobre foi produzido, em articulação com a literatura sobre o assunto e os dados presentes na mesma

O Riot Grrrls, segundo SCHILT(2003) é um trocadilho com a expressão Riot Grrrls onde o termo “Grrrls” surge a partir da junção das palavras “girl” de garota e “grow”, de desenvolver-se. Este é o nome dado ao movimento feminista originariamente, advindo do desejo de denunciar a opressão da mulher na sociedade patriarcal, tentando desmistificar estereótipos arraigados na cultura da sociedade ocidental.

No início da década de 1990, os Estados Unidos conheceram o movimento Riot Grrrl. Em oposição ao machismo da cena punk, que pregava a liberdade do indivíduo, mas que, anacronicamente, reservava às mulheres o papel de namoradas e meras coadjuvantes do

movimento, surgiram as garotas rebeladas: mulheres que saíram dos bastidores da cena

para tocar instrumentos pesados, montar bandas e escrever fanzines. O primeiro fanzine

feminista de que se tem notícia é o Riot Grrrl, produzido por Molly Neuman, da banda punk

Bratmobile, e que intitulou o movimento (BARREIROS(2008).

Foi através da agressividade do punk rock e também do hard core, estilo de predominância masculina, que se firmou o movimento, produzindo festivais de música, fanzines2 (mais chamados de zines) em papel e composto por materiais de cunho feministas, que era a pauta do movimento, juntando música, poema e discurso na mesma estética. Foi inspirado neste movimento que aconteceu em Belo Horizonte no ano de 2009 o I Riot Grrrls Not Dead, adaptado a realidade brasileira e dos nossos dias, abrindo espaço para outras vertentes do rock contemporâneo, tal como hard rock.

 

Aqui em Belo Horizonte, foi também o feminismo o ponto de partida para a empreitada. A produção do Riot Grrrls Not Dead foi feita pelas garotas que compõem a banda de hard core feminista Bertha Lutz, que surgiu em 2008 motivada pelo cenário de bandas igualmente feministas do underground de BH. São elas Bah no vocal, Rafa no baixo, Gabi na guitarra e Paulinha na bateria.Todas tinham o mesmo desejo de que a Bertha Lutz não fosse apenas um grupo de rock mas sim uma forma de protesto feminista. De 2008 até 2010 a Bertha Lutz se apresentou diversas vezes, conseguindo um espaço interessante na cena1 de Belo Horizonte. Porém os eventos em que elas tocavam eram produzidos por amigos ou por pessoas que estavam desvinculadas da ação política feminista, e naturalmente não a empregavam em suas produções, o que frustrava as pretensões da banda Bertha Lutz, que ensejava um ativismo musical através de suas composições e performance. Para acabar com essa frustração, uma saída encontrada foi organizar os próprios eventos. O primeiro foi feito em março de 2011, em homenagem ao mês da mulher, foi o primeiro Riot Grrrls’s Not Dead, onde foram convidadas bandas formadas por mulheres, porém politizadas. Segundo Bárbara (Bah), vocalista da Bertha Lutz e uma das fundadoras do Coletivo #Nada Frágil, foi bem sucedida essa primeira experiência com o festival por dois aspectos importantes: um bom número de público pagante, 110 pessoas; e o principal, trazer à tona questões como o papel da mulher.

 

Conclusão

A investigação acerca do evento Riot Grrrl’s Not Dead e sua conexão com a cena rock de Belo Horizonte permitiu evidenciar como o feminismo encontrou na música um espaço de resistência e expressão. Inspirado pelo movimento Riot Grrrl dos anos 1990, o evento não apenas celebrou a presença feminina no cenário underground, mas também ressignificou o papel das mulheres na música, transformando o palco em um território de luta e reivindicação.

A realização do festival, liderada por integrantes da banda feminista Bertha Lutz, demonstrou como ações organizadas podem criar espaços autênticos e politizados, onde a música transcende sua função artística e se torna uma ferramenta de transformação social. A articulação de bandas, produtores e público em torno de pautas feministas reafirma que movimentos como o Riot Grrrl’s Not Dead desempenham um papel essencial na desconstrução de estereótipos de gênero no rock e na sociedade como um todo.

Ao resgatar esse episódio da cena musical de Belo Horizonte, este estudo não apenas preserva uma memória significativa, mas também contribui para a compreensão dos desafios e conquistas das mulheres no cenário musical. Através do ativismo cultural, iniciativas como essa reforçam a mensagem de que o feminismo na música permanece vivo e relevante, ecoando tanto nos bastidores quanto nos grandes palcos. O Riot Grrrl não está morto – ele continua a inspirar, criar e resistir.

Deh Muss

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Marcela Velon lança livro sobre coletivos de mulheres músicas https://sonorafestival.com/marcela-velon-lanca-livro-sobre-coletivos-de-mulheres-musicas/ https://sonorafestival.com/marcela-velon-lanca-livro-sobre-coletivos-de-mulheres-musicas/#respond Tue, 26 Nov 2024 17:26:39 +0000 https://sonorafestival.com/?p=883 A música sempre foi uma importante ferramenta de expressão cultural e transformação social. No entanto, as mulheres historicamente enfrentam barreiras significativas para ocupar um espaço de protagonismo nesse cenário. O livro “Ação e obra de três coletivos de mulheres músicas na cidade do Rio de Janeiro: uma análise feminista e decolonial”, de Marcela Velon, chega para jogar luz sobre essas questões e celebrar o impacto transformador dos coletivos femininos na música carioca.

A obra, fruto da pesquisa de Marcela Velon no Programa de Pós-Graduação em Música da UNIRIO, é um estudo detalhado sobre a atuação de três coletivos musicais formados por mulheres no Rio de Janeiro entre 2017 e 2022: “Primavera das Mulheres”, “Essa Mulher” e “Sonora RJ” (edição carioca do Sonora – Festival Internacional de compositoras). Esses grupos, além de criarem música, desafiam estruturas sociais e culturais, trazendo uma nova perspectiva ao mercado musical brasileiro.

Velon faz uma análise rica e aprofundada das ações e produções artísticas desses coletivos, explorando como eles utilizam a música para questionar o status quo e propor novas narrativas. O livro combina teoria feminista e decolonial para compreender o impacto dessas iniciativas em um cenário historicamente marcado por desigualdades de gênero.

O mercado musical, como outras áreas culturais, muitas vezes reproduz dinâmicas de exclusão e preconceito. Marcela Velon aborda como esses coletivos trabalham para romper barreiras e como suas composições refletem experiências, lutas e conquistas das mulheres. A pesquisa também analisa como esses movimentos dialogam com questões de representatividade, equidade e identidade.

 

Além disso, a obra destaca o papel fundamental da coletividade no enfrentamento dos desafios. Os três coletivos analisados promovem a união entre mulheres, criando espaços seguros para que possam produzir, compartilhar e valorizar sua arte.

Análise Feminista e Decolonial

Uma das grandes contribuições do livro é a abordagem teórica que combina o feminismo com uma perspectiva decolonial. Isso permite uma leitura mais ampla e inclusiva, que considera não apenas a questão de gênero, mas também os contextos históricos e sociais que moldaram as dinâmicas de poder na música brasileira.

Essa abordagem nos convida a refletir sobre as raízes das desigualdades e a importância de reimaginar as estruturas culturais, colocando mulheres como protagonistas e criadoras de suas próprias narrativas.

O livro evidencia como, no período estudado, os coletivos femininos ajudaram a transformar a cena musical carioca. Suas ações ultrapassaram o universo artístico, influenciando festivais, eventos e até mesmo a percepção do público sobre o papel da mulher na música.

Frases como “toca que nem homem” e outros estereótipos passaram a ser confrontados, enquanto temas antes evitados ganharam destaque nas composições e discussões promovidas por esses grupos. Essa transformação, documentada por Velon, reforça a importância de movimentos culturais como ferramentas de mudança social.

Se você é apaixonado por música, interessado em questões de gênero, ou simplesmente curioso sobre como coletivos culturais estão moldando o futuro da arte no Brasil, este livro é para você. É uma leitura essencial para músicos, pesquisadores, estudantes e todos que acreditam no poder transformador da arte.

“Ação e Obra de Três Coletivos de Mulheres Músicas na Cidade do Rio de Janeiro” é uma obra que inspira, provoca e transforma. Ao destacar a força e a resiliência de mulheres na música, Marcela Velon nos lembra que a arte é um espaço de resistência e reinvenção. Este livro é um convite para repensarmos nossas próprias narrativas e reconhecermos o impacto das mulheres como agentes de mudança.

Se você quer se aprofundar nesse universo, adquira o livro pela Editora Multifoco e descubra como a música pode ser um poderoso grito de resistência e empoderamento.

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A música como ferramenta de diplomacia cultural na Ibero-América. https://sonorafestival.com/a-musica-como-ferramenta-de-diplomacia-cultural-na-ibero-america/ https://sonorafestival.com/a-musica-como-ferramenta-de-diplomacia-cultural-na-ibero-america/#respond Mon, 25 Nov 2024 03:17:36 +0000 https://sonorafestival.com/?p=869 Nesta entrevista conduzida por João Morado, Isabella Bretz, investigadora, cantora, compositora, gestora cultural e analista internacional, reflete sobre sua pesquisa recente intitulada “A música como ferramenta de diplomacia cultural na Ibero-América”, que integrou o programa Ibermúsicas 2023. O estudo explora o papel da música na construção de relações internacionais e na promoção de políticas públicas inclusivas entre países ibero-americanos. Ao longo da conversa, Bretz aborda temas como os desafios e oportunidades da diplomacia cultural, o impacto social e político da música e as possibilidades de colaboração internacional no cenário artístico. 

Investigadora, cantora, compositora, gestora cultural e analista internacional: vertentes de interesse não faltam à multifacetada Isabella Bretz. A brasileira radicada em Portugal foi uma das vencedoras da convocatória Ibermúsicas 2023, programa que lhe permitiu realizar um importante estudo sobre “A Música Como Ferramenta de Diplomacia Cultural na Ibero-América”. Nele, propôs-se a compreender de que forma a música desempenha um papel fundamental na ligação e construção de relações internacionais com os países sul-americanos onde o português e o espanhol são as línguas predominantes.  

Os resultados desta investigação serão apresentados no evento inaugural do MATE 2024, um festival que promove o diálogo intercultural, o reconhecimento de talento e a inovação, além de ser uma plataforma de encontro para profissionais das Indústrias Culturais e Criativas. Como descrito na sua sinopse, este foi um estudo em que Bretz abordou “possibilidades e desafios para que festivais e artistas atuem como embaixadores culturais, fortalecendo os laços culturais e económicos entre os países ibero-americanos”, tendo permitido à investigadora “explorar como a música pode desempenhar um papel importante na criação e manutenção de políticas públicas que visam garantir maior igualdade de oportunidades e inclusão para músicos de diferentes géneros e origens étnicas.”  

 

Da motivação por trás desta pesquisa, passando pela discussão dos seus métodos e conclusões, até às projeções de futuro baseadas em observações empíricas, conversámos com Isabella Bretz para compreender e perspetivar o papel da música no mundo contemporâneo. As respostas da investigadora oferecem uma visão esclarecedora sobre aquilo que torna a música numa ferramenta poderosa e transversal a todo o tecido social, com um impacto profundo em áreas que vão do entretenimento à cultura, da economia à política.

 

Foi uma das vencedoras da convocatória Ibermúsicas 2023, programa que apoiou o seu projeto de investigação centrado na música como ferramenta de diplomacia cultural na Ibero-América. Como surgiu a ideia de desenvolver este estudo e qual a motivação por detrás dele?

 

Este é um tema que adoro, que já estudo e com o qual trabalho há vários anos. Apesar de hoje ser artista e produtora cultural, essas não são minhas áreas de formação. Sou graduada em Relações Internacionais e também fiz uma pós-graduação em Direito Internacional, então assuntos relacionados a internacionalizações fazem parte da minha vida há bastante tempo (inclusive, outro nome que se dá ao profissional, além de “analista internacional”, é “internacionalista”). Desde quando comecei a minha carreira artística, em 2012, minha ideia era construir um caminho um pouco diferente, que unisse esses dois universos de alguma forma. Felizmente, é assim que tem sido! Desenvolvo um projeto multidisciplinar chamado “Abreviar Distâncias”, com foco na lusofonia, além de outras iniciativas que envolvem cultura internacionalmente, como o Sonora – Festival Internacional de Compositoras. Dando sequência aos meus trabalhos e pensando no que propor para o programa Ibermúsicas, que é sempre muito aberto a ideias variadas, pensei: “Que tal trazer esse debate sobre diplomacia cultural, tendo como referência a Ibero-América?”. Deu certo! Acho importantíssimo olharmos para a cultura sob diferentes lentes, não somente a criativa, mas a econômica e política também. E a região ibero-americana tem uma diversidade cultural gigantesca, além de muita facilidade de comunicação. Precisamos criar mais pontes. É a minha segunda pesquisa com recorte na região. No ano passado, também com apoio do Ibermúsicas, iniciei um mapeamento de iniciativas de empoderamento feminino na música na Ibero-América, ao lado da Deh Muss e do Sonora. Essa pesquisa, inclusive, cresceu demais, recebeu alguns apoios importantes e se tornará uma plataforma online. Mas isso eu conto melhor no MATE.

 

Vai apresentar os resultados desta investigação como evento inaugural do MATE 2024, um festival que promove o diálogo intercultural, o reconhecimento de talento e a inovação. De que forma decorrerá esta apresentação e como acredita que poderá dar o mote para o resto do festival?

 

Estar no MATE com esta investigação é um motivo de grande alegria para mim! Não faz sentido estudar um tema como esse sem discutir publicamente, sem trocar experiências, debater medidas, políticas públicas. O MATE é um encontro riquíssimo, com pessoas de diferentes posições na cadeia produtiva da cultura e também do poder público. É uma excelente ágora! Por isso, é o espaço perfeito para essa apresentação. Vou compartilhar com as pessoas um pouco da minha trajetória nesse âmbito, as motivações da pesquisa, informações sobre alguns programas de internacionalização e levantar pontos para debate (algumas críticas ao que tem sido feito hoje e também o compartilhamento de boas práticas que podem ser replicadas). Meu maior objetivo é sairmos de lá pensando em como construir processos mais eficazes, efetivos e eficientes para que possamos representar nossos países internacionalmente, trazendo resultados concretos para nós, da classe artística, e para os países. Essa conexão do assunto com a essência do MATE pode gerar boas conversas nos dias seguintes, aproximando as pessoas e criando pontes internacionais de colaboração, especialmente pela identificação que os países Ibero-Americanos têm entre si. 

 

“A Cantiga É Uma Arma”, música de José Mário Branco lançada em 1975, é um importante lembrete do papel político que a música pode ter. No seu projeto, concluiu que a música desempenha um papel relevante na criação e manutenção de políticas públicas que visam garantir sociedades plurais e inclusivas. Quais são os mecanismos que levam a música e a política a imiscuir-se?

 

Música é política. Simplesmente não consigo ver de outra forma. Não precisa ser música de protesto para ser política. Até mesmo a que é percebida como puro entretenimento tem sua função social. A música retrata o tempo, a fase histórica, o pensamento, valores de uma comunidade, hábitos, organizações sociais. Ela cria senso de comunidade, fortalece identidades coletivas (“positiva” e “negativamente”). Vejam que exemplo mais emocionante: o sinal para que a Revolução de 25 de Abril começasse não foi um tiro, foi uma canção. O que “Grândola, Vila Morena” desperta em nós e em nosso comportamento é política! Na diplomacia cultural, como vamos tratar, a música tem a capacidade de ser um instrumento de paz, de compreensão entre os povos, de promoção da imagem internacional de um país. Ela pode retratar problemas a serem resolvidos, soluções a serem replicadas. Já pensaram por que há tanto plágio e utilização indevida de músicas em campanhas políticas? Ou por que tantas são censuradas em ditaduras? Porque existe nessa linguagem artística um poder incalculável sobre a sociedade. Eu desconheço algo que entre em nossa mente com tanta facilidade, sem pedir licença, tomando conta de nossos pensamentos. Já tentou ler um livro com uma música na cabeça? Você precisa ler 5 vezes o mesmo parágrafo. E você não precisa gostar dela para que tenha esse efeito. Afinal, todos nós sabemos de cor músicas que consideramos péssimas! 

 

A política está relacionada à maneira como organizamos nossa sociedade e às decisões que tomamos para conviver coletivamente. Se a música expressa e molda pensamentos e costumes, que por sua vez se tornaram ou se tornarão decisões e ações, ela faz parte deste grande guarda-chuva que é a política. Além disso, ela forma uma indústria com milhões de empregos diretos e indiretos no mundo, gira a economia, atrai turismo cultural, contribui para o PIB e demanda legislações e direitos. Por isso, quando alguém diz que um artista deve apenas cantar suas músicas e deixar a política de lado (e não é preciso ser um Roger Waters para ouvir isso, eu mesma já ouvi), penso: “Meu caro Watson… Sinto muito mas não vai dar para obedecer aos seus desejos… É impossível”. 

 

Identificou determinados padrões ou parâmetros como sendo promotores de uma relação saudável e construtiva entre música, política e sociedade? 

 

Eu acredito que vários fatores são importantes para uma relação saudável entre música, política e sociedade. O primeiro deles é a liberdade de expressão, a autonomia no fazer artístico. É impossível gerar impacto com a música se não se pode falar sobre determinados assuntos, se não há liberdade crítica e autenticidade (lembrando aqui, obviamente, que crime de ódio não é liberdade de expressão). Outro fator crucial é a sustentabilidade das carreiras e a garantia de uma vida estruturada para profissionais da música: tempo para criar, remuneração justa, políticas públicas que funcionem, boas estratégias e investimento em formação de público, condições para circulação (“Todo artista tem de ir aonde o povo está”, já cantava Milton Nascimento), conscientização da população sobre o valor da cultura, entre outros. 

 

Democratização do acesso à cultura é também primordial, afinal as obras precisam chegar no povo, dialogar com o povo e gerar respostas de quem ouve. É preciso oferecer diversas formas de arte à população, mas se o objetivo for falar com o máximo de pessoas, linguagens mais rebuscadas e, de certa forma, elitistas, não cumprirão esse papel. A experimentação e a inovação são fundamentais, mas temos que entender que, para comunicar com a base, é preciso falar a sua língua. E dá pra fazer isso de forma inteligente e estimulante, isso não significa fazer arte plástica e pobre em conceito. Essa articulação entre música, política e sociedade precisa ser capaz de mobilizar as pessoas, de criar senso de coletividade. Enquanto respondia, lembrei de uma música brasileira que fez imenso sucesso, foi cantada e dançada por todo o país. A letra dizia: “Analisando essa cadeia hereditária / Quero me livrar dessa situação precária / Onde o rico cada vez fica mais rico / E o pobre cada vez fica mais pobre / (…) Mas eu só quero educar meus filhos / Tornar um cidadão com muita dignidade / Eu quero viver bem, quero me alimentar (…)”. Vejam quanta crítica existe nessa música! E alcançou milhões de pessoas. Só não se identifica quem é herdeiro ou milionário, uma parcela muito pequena da população. Reafirmo, mais uma vez, que não precisa ser uma música de protesto para ser política. Músicas com outras mensagens, em outras linguagens, também criam pertencimento, inspiram pensamentos e decisões coletivas. Da mesma forma, a acessibilidade física precisa ser garantida, para que essa relação aconteça em todas as camadas da sociedade. 

 

E a diplomacia cultural tem sido uma ferramenta efetiva na construção desse diálogo entre música, política e sociedade?

 

Sim, a diplomacia cultural tem colaborado para a construção e o fortalecimento desse diálogo, mas é uma etapa posterior e ainda pode melhorar muito. Lembro que diplomacia cultural não é diplomacia artística, a cultura é algo muito mais amplo, abrangente, para além da arte. Mas vou me ater ao recorte da nossa conversa, que é a música. Por meio de eventos musicais, residências artísticas, colaborações entre artistas de diferentes países, programas de cooperação cultural e muitas outras iniciativas, pode-se conseguir bons resultados sociais, por exemplo: fomentar debates sobre questões que afetam os países de forma comum; fortalecer grupos marginalizados; promover soluções que podem ser reproduzidas em outros lugares; trabalhar a compreensão e a conciliação entre os povos; aproximar através de semelhanças e despertar interesse de um povo no outro; despertar a curiosidade através de grandes diferenças e muito mais. Mas, para que isso aconteça, assim como os resultados comerciais, econômicos e culturais em geral, é preciso que a diplomacia cultural seja pensada em conjunto, com a participação fundamental do governo, com políticas públicas, com incentivo a uma produção artística diversa e à circulação internacional.  

 

Uma das principais teses da sua pesquisa é que a música contribui positivamente para as relações internacionais. No contexto ibero-americano, quais são alguns exemplos marcantes deste papel diplomático, agregador ou conciliatório que a música tem desempenhado entre nações?

 

O Brasil é um país com dimensões continentais, com uma população de cerca de 215 milhões de pessoas e é o único país que fala português na América do Sul. Seu mercado artístico é borbulhante em praticamente todas as áreas. E um grande diferencial é que ele consome intensamente a arte que é produzida em seu território. Seja nas novelas, nos festivais, no rádio ou nas plataformas de streaming, os brasileiros são apaixonados por música brasileira. Ainda bem! Mas além disso ser um grande ponto positivo, uma verdadeira conquista, também traz isolamento de outros países da região. É inacreditável que estejamos totalmente cercados por países hispânicos e os brasileiros praticamente não falam espanhol/castelhano. Até poucos anos atrás, apesar da boa recepção a grandes nomes como Shakira, Ricky Martin e Jorge Drexler, a música latina tinha pouco espaço no Brasil. Entretanto, com a explosão de gêneros musicais latinos nos E.U.A., no mundo e também no Brasil, o aumento do interesse dos brasileiros por países da América do Sul, assim como em sua língua, aumentou significativamente. Ritmos como reggaeton, cumbia e pop hoje fazem o público do país dançar e cantar em uma língua que não fez verdadeiramente parte da sua formação. Quem é que não conhece “Despacito”, de Luis Fonsi? Com o crescimento dessa conexão, estratégias de colaboração são muito usadas por artistas como Anitta e Ludmilla, não apenas para conquistarem novos públicos estrangeiros, mas porque seu público nacional também recebe muito bem essas parcerias. Do outro lado do Atlântico, nomes espanhóis como Rosalía e Silvia Perez Cruz vão conquistando os corações. É claro que este não é o único motivo, é um conjunto de fatores. Mas hoje vê-se muitos mais brasileiros interessados em conhecer a Argentina, Uruguai, Chile, Colômbia… É inegável que o aumento da identificação cultural com estes países através da música traz uma aproximação emocional, fomento do turismo para esses destinos e maior busca pelo aprendizado da língua. Isso também se reflete com a geração de novas parcerias profissionais, motivações para realização de negócios e mais. 

 

O seu projeto também aborda as possibilidades e desafios para que festivais e artistas atuem como embaixadores culturais. Quais são as vantagens (e riscos, caso os haja), quer para os músicos, quer para os países, associados à internacionalização artística?

 

Existe uma certa visão de que internacionalizar é dominar o mundo. Mas não é bem assim. É possível internacionalizar em muitos níveis diferentes, tanto em termos de abrangência territorial como de impacto. Para os artistas, é muito bom abrir portas internacionais para alcançar mais visibilidade, estabelecer novas pontes de colaboração, desenvolver no âmbito profissional, estando expostos a novas formas de trabalhar, além de desenvolver pessoalmente. O artista é um criador, precisa de experiência de vida para produzir. Estar em outro país é um prato cheio para ter mais inspiração. Nas feiras internacionais de música, por exemplo, pode-se observar como os profissionais de diferentes lugares trabalham, como são feitas as contratações, como os artistas se apresentam, como o público reage… Um mesmo show em países diferentes gera reações diversas da plateia. Isso acontece até de cidade para cidade em um mesmo país. Esse repertório cultural só enriquece a trajetória artística e traz uma visão muito mais ampla da profissão e do mercado no qual se está atuando. No caso de festivais, há, por exemplo, a possibilidade de receber mais turistas estrangeiros ou de realizar uma edição em outro país. O Rock in Rio fez as duas coisas de forma brilhante. Existem festivais brasileiros criando edições em Portugal, como o próprio Rock in Rio, MIMO, Coala, VillaMix e outros. 

 

Dentre os desafios, com certeza o principal é financeiro, pois são processos que demandam vários custos como passagens aéreas, hospedagem, produções, vistos, dependendo do país, etc. A logística é sempre muito mais cara. Para dar a volta, é importante conseguir o máximo de parcerias no local de destino, evitando transportes e importações, além de buscar apoios como editais culturais e leis de incentivo. Na Ibero-América, a língua pode ser uma barreira. Apesar de o “portunhol” salvar muitas vezes, em alguns casos é necessária uma comunicação mais formal ou até mais longa. Então, se souber a língua do país de destino, mesmo que em nível intermediário, já é muito melhor. Posso citar também o risco que se corre ao não fazer uma boa leitura do país de destino. Lembre-se: você é o estrangeiro. É você que se adapta ao local, não o contrário. É preciso pesquisar sobre os costumes do público, como funciona normalmente a produção, a média de valor que se cobra para um show de um artista com alcance semelhante ao seu, o tipo de casa de show/estabelecimento/festival, a conexão do público em questão com sua linguagem artística, que abordagem usar na divulgação e muito mais.

 

Para os países, as oportunidades são muitas: promoção da cultura nacional, despertar o interesse do público estrangeiro em seu país, incentivo ao turismo, desenvolvimento econômico através dos ganhos de artistas nacionais em outros mercados, incentivo ao desenvolvimento de uma música mais criativa, com diferentes influências, atração de patrocínios e investimentos não somente na música mas em outros setores e, principalmente, aumento do seu soft power internacional. Os riscos são menores que os ganhos, mas posso citar, por exemplo, uma representação com estereótipo negativo, promovendo uma imagem indesejada do país e perda de identificação do artista muito internacionalizado com suas raízes. 

 

Quais são as áreas em que a música tem maior impacto político e social e aquelas onde, apesar de tentativas, o seu impacto ainda é limitado? Qual o caminho a seguir para aumentar esse impacto no futuro?

 

Pela minha experiência, observo que a música tem mais impacto político e social em áreas como identidade cultural, defesa da democracia e ativismo social em geral (como denúncias de grupos marginalizados pela sociedade, promoção da inclusão, etc). Há músicas que acabam se tornando “hinos” de algumas causas, como a igualdade de gênero e a inclusão LGBTQIAPN+. São músicas que mobilizam muitas coletividades, que são trilhas sonoras de protestos, de ações afirmativas e de obras audiovisuais que tenham esse propósito, por exemplo. Na educação, a música também tem um grande impacto. Até hoje lembro de conteúdos que foram ensinados na escola com música. No ensino de línguas e de literatura, é presença praticamente garantida e traz ótimos resultados. Inclusive, agora em setembro vou apresentar um trabalho na conferência TROPO, na Inglaterra, sobre a utilização de poemas musicados no ensino de literatura. E nele compartilho uma experiência pessoal, que é a utilização do meu álbum Canções Para Abreviar Distâncias no meio acadêmico, especialmente pela professora Cássia de Abreu na San Diego State University, num programa que já é realizado há 4 anos. A música também tem um ótimo papel em projetos de ação social, especialmente para crianças e adolescentes em áreas vulneráveis. Um exemplo simplesmente espetacular, replicado em várias partes do mundo, é o “El Sistema”, um modelo educativo musical desenvolvido na Venezuela por José Antonio Abreu. O programa, que é gerido pela Fundación del Estado para el Sistema Nacional de las Orquestas Juveniles e Infantiles de Venezuela (FESNOJIV), é amplamente reconhecido por seu impacto significativo na educação musical e no desenvolvimento social de jovens em situação de vulnerabilidade. Além de transformar vidas através da música, tem uma força artística impressionante, formando músicos de excelência. Em Portugal, a Orquestra Geração surgiu dessa inspiração. 

 

Com relação às áreas de menos impacto, acredito que saúde seja uma delas. Não se escreve muito sobre saúde física, embora já existam muitas canções sobre saúde mental e que ajudam as pessoas a normalizarem a busca por tratamentos e melhores estilos de vida. Outra área que pode ser muito mais desenvolvida com o apoio da música é a sustentabilidade e proteção do meio ambiente. A criação de programas públicos com este fim pode auxiliar nesse crescimento. Portugal, através da DGArtes, deu um bom exemplo com o concurso “Arte e Ambiente”. Participei e por meio dele lancei, com o coletivo “pequenezas” do qual faço parte, um álbum com 6 microcontos e 6 minicanções sobre várias temáticas ligadas ao meio ambiente. Foi muito bom pensar sobre tudo isso durante o processo de criação e a obra pequenezas: cada passo até o amanhã foi bem recebida pelo público. Mais iniciativas assim por parte dos governos são muito bem-vindas para ocupar mais espaços, tratando desses temas através da música.

 

Ao meu ver, a forma de aumentar o impacto é aumentar o investimento. Mais interesse em produzir música com diferentes temáticas gera mais debates, mais ação e mais mudança.

 

Além de investigadora, é também cantora, compositora, gestora cultural e analista internacional. Por exemplo, é co-criadora do Sonora Festival, um encontro internacional que tem como objectivo o reconhecimento e valorização das mulheres compositoras e a mitigação de desigualdades de género no meio musical.  De que forma todas estas valências e o seu trabalho em diversas frentes motivaram e contribuíram para o desenvolvimento deste projeto de investigação?

 

Eu trabalho com muitas, muitas coisas diferentes. Se eu fizer uma lista completa, vão dizer que sou doida, sem foco, perdida, dispersa e qualquer outro sinônimo que encontrarem. Mas na minha mente existe um sentido, existe uma linha que permeia tudo isso, e existe um caminho. A cada dia que passa, esse caminho toma uma forma mais concreta. Em 2011, eu desisti do mestrado em Relações Internacionais para o qual estava tentando entrar para gravar um disco. Passei os anos seguintes trabalhando com música e cultura, realizando projetos que uniam esse mundo artístico à minha formação. Aos poucos, foram acontecendo coisas que confirmaram essa direção. Em 2016, fui uma das criadoras do Sonora – Festival Internacional de Compositoras, do qual sou coordenadora geral até hoje, ao lado da Deh Muss, idealizadora dessa rede que, por um trabalho coletivo, chegou a 16 países e 74 cidades. Ele foi e é uma revolução constante na minha vida e na de milhares de mulheres que passam por ele como artistas e na produção. Em 2017, lancei o Canções Para Abreviar Distâncias: uma viagem pela língua portuguesa, e com ele tenho trabalhado a lusofonia com shows, atividades culturais e acadêmicas em muitos países. Em 2023, fui convidada para ser Mestre de Cerimônias e mediadora do Dia Mundial da Língua Portuguesa, na sede da UNESCO, em Paris. Esta foi, para mim, a coroação de que a caminhada estava na direção certa, pois, além de estar no contexto da lusofonia, uma das áreas em que atuo, aconteceu em uma instituição que trabalha a paz no mundo através da cultura e da educação. Hoje estamos aqui conversando sobre Diplomacia Cultural na Ibero-América. Sou curiosa, gosto do mundo, gosto de muito. Essa pesquisa é o resultado disso, da vivência cultural no chão de fábrica, na base da pirâmide, e do estudo de um pedacinho do mundo. As coisas levam tempo para maturar. Quanto mais aprendo, mais vejo que há muito para aprender. No fim, é tudo uma coisa só, é a minha história. Hoje, o que eu queria costurar na minha vida há 13 anos atrás, costurado está.

 

Texto de João Morado, publicado em 9 de setembro de 2024 no MATE – Música, Arte, Tecnologia e Educação.

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