Este artigo apresenta memórias e registros extraídos de minha monografia para a obtenção do diploma no curso de Licenciatura em Música pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), concluída em 2011. Nele, analiso um aspecto do feminismo na música que, à época, manifestava-se predominantemente na cena underground de Belo Horizonte. Este recorte histórico oferece uma base para refletirmos sobre os caminhos percorridos pelo feminismo na música, especialmente até o período pós-2015, quando o movimento ganha força e começa a ocupar também o mainstream musical.
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Este trabalho possui como principal objetivo uma investigação, de um evento musical de cunho feminista, com bandas de rock – RIOT GRRRL’S NOT DEAD – considerando o evento como um todo, tendo um foco mais específico: a relação entre as bandas e a diferença de gênero nesta estética musical. Para que fosse alcançado tal objetivo, a metodologia constou de depoimentos das produtoras do evento e um documentário sobre foi produzido, em articulação com a literatura sobre o assunto e os dados presentes na mesma
O Riot Grrrls, segundo SCHILT(2003) é um trocadilho com a expressão Riot Grrrls onde o termo “Grrrls” surge a partir da junção das palavras “girl” de garota e “grow”, de desenvolver-se. Este é o nome dado ao movimento feminista originariamente, advindo do desejo de denunciar a opressão da mulher na sociedade patriarcal, tentando desmistificar estereótipos arraigados na cultura da sociedade ocidental.
No início da década de 1990, os Estados Unidos conheceram o movimento Riot Grrrl. Em oposição ao machismo da cena punk, que pregava a liberdade do indivíduo, mas que, anacronicamente, reservava às mulheres o papel de namoradas e meras coadjuvantes do
movimento, surgiram as garotas rebeladas: mulheres que saíram dos bastidores da cena
para tocar instrumentos pesados, montar bandas e escrever fanzines. O primeiro fanzine
feminista de que se tem notícia é o Riot Grrrl, produzido por Molly Neuman, da banda punk
Bratmobile, e que intitulou o movimento (BARREIROS(2008).
Foi através da agressividade do punk rock e também do hard core, estilo de predominância masculina, que se firmou o movimento, produzindo festivais de música, fanzines2 (mais chamados de zines) em papel e composto por materiais de cunho feministas, que era a pauta do movimento, juntando música, poema e discurso na mesma estética. Foi inspirado neste movimento que aconteceu em Belo Horizonte no ano de 2009 o I Riot Grrrls Not Dead, adaptado a realidade brasileira e dos nossos dias, abrindo espaço para outras vertentes do rock contemporâneo, tal como hard rock.
Aqui em Belo Horizonte, foi também o feminismo o ponto de partida para a empreitada. A produção do Riot Grrrls Not Dead foi feita pelas garotas que compõem a banda de hard core feminista Bertha Lutz, que surgiu em 2008 motivada pelo cenário de bandas igualmente feministas do underground de BH. São elas Bah no vocal, Rafa no baixo, Gabi na guitarra e Paulinha na bateria.Todas tinham o mesmo desejo de que a Bertha Lutz não fosse apenas um grupo de rock mas sim uma forma de protesto feminista. De 2008 até 2010 a Bertha Lutz se apresentou diversas vezes, conseguindo um espaço interessante na cena1 de Belo Horizonte. Porém os eventos em que elas tocavam eram produzidos por amigos ou por pessoas que estavam desvinculadas da ação política feminista, e naturalmente não a empregavam em suas produções, o que frustrava as pretensões da banda Bertha Lutz, que ensejava um ativismo musical através de suas composições e performance. Para acabar com essa frustração, uma saída encontrada foi organizar os próprios eventos. O primeiro foi feito em março de 2011, em homenagem ao mês da mulher, foi o primeiro Riot Grrrls’s Not Dead, onde foram convidadas bandas formadas por mulheres, porém politizadas. Segundo Bárbara (Bah), vocalista da Bertha Lutz e uma das fundadoras do Coletivo #Nada Frágil, foi bem sucedida essa primeira experiência com o festival por dois aspectos importantes: um bom número de público pagante, 110 pessoas; e o principal, trazer à tona questões como o papel da mulher.
Conclusão
A investigação acerca do evento Riot Grrrl’s Not Dead e sua conexão com a cena rock de Belo Horizonte permitiu evidenciar como o feminismo encontrou na música um espaço de resistência e expressão. Inspirado pelo movimento Riot Grrrl dos anos 1990, o evento não apenas celebrou a presença feminina no cenário underground, mas também ressignificou o papel das mulheres na música, transformando o palco em um território de luta e reivindicação.
A realização do festival, liderada por integrantes da banda feminista Bertha Lutz, demonstrou como ações organizadas podem criar espaços autênticos e politizados, onde a música transcende sua função artística e se torna uma ferramenta de transformação social. A articulação de bandas, produtores e público em torno de pautas feministas reafirma que movimentos como o Riot Grrrl’s Not Dead desempenham um papel essencial na desconstrução de estereótipos de gênero no rock e na sociedade como um todo.
Ao resgatar esse episódio da cena musical de Belo Horizonte, este estudo não apenas preserva uma memória significativa, mas também contribui para a compreensão dos desafios e conquistas das mulheres no cenário musical. Através do ativismo cultural, iniciativas como essa reforçam a mensagem de que o feminismo na música permanece vivo e relevante, ecoando tanto nos bastidores quanto nos grandes palcos. O Riot Grrrl não está morto – ele continua a inspirar, criar e resistir.
Deh Muss